Em meio à crescente complexidade das operações financeiras empresariais, o risco sacado tem ganhado relevância como uma prática comum em empresas de médio e grande porte — especialmente na indústria, construção civil, varejo e agronegócio. Embora ofereça vantagens logísticas e de fluxo de caixa, essa operação exige atenção redobrada por parte dos contadores, pois seu impacto nas demonstrações contábeis pode gerar distorções relevantes, além de implicações no compliance e na análise de riscos.
Neste artigo, você vai entender o que é risco sacado, como funciona essa operação, seus efeitos sobre a contabilidade, exemplos práticos, e como contadores podem lidar com essa prática de forma segura e técnica.
O risco sacado é uma operação financeira em que o fornecedor antecipa o recebimento de um título a partir de um aceite formal da empresa compradora, transferindo o risco de inadimplência para ela. Em outras palavras, o banco realiza o pagamento ao fornecedor antes do vencimento da fatura, mas quem responde pelo valor é a empresa compradora — ou seja, ela se torna o "sacado" da operação, assumindo o compromisso com a instituição financeira.
Essa operação também é conhecida como confirming e vem sendo adotada como alternativa ao crédito tradicional por empresas que buscam fortalecer o relacionamento com fornecedores e obter mais prazo para pagamento.
Para entender melhor o fluxo da operação, veja um exemplo prático:
Com esse modelo, o fornecedor recebe à vista e a empresa ganha prazo para pagar. Entretanto, essa comodidade vem acompanhada de responsabilidades contábeis que não podem ser ignoradas.
Apesar de ser uma prática comum, muitos gestores subestimam o impacto do risco sacado nas demonstrações contábeis. Em diversas empresas, essa operação ainda é registrada como conta a pagar a fornecedores, quando na verdade, o passivo deve ser reclassificado como financiamento bancário ou operação financeira.
Essa classificação incorreta pode gerar:
A depender do volume dessas operações, a omissão pode ser interpretada como tentativa de ocultar o real nível de endividamento da empresa, o que compromete o princípio da fidedignidade das demonstrações financeiras.
Conforme os princípios contábeis e as orientações dos CPCs 26 (Apresentação das Demonstrações Contábeis) e 39 (Instrumentos Financeiros: Apresentação), o risco sacado não deve ser registrado como simples dívida com fornecedores, uma vez que a obrigação é transferida para uma instituição financeira. Nessa circunstância, a empresa passa a deter uma obrigação de natureza financeira, caracterizando-se como passivo bancário. O Ofício-Circular CVM/SNC/SEP nº 02/2016 reforça a importância da transparência e da correta classificação dessas operações nas demonstrações contábeis.
🔍 A contabilização adequada deve considerar:
Esse cuidado é ainda mais relevante em setores como varejo, indústria de bens de consumo, atacado, agronegócio e construção civil, onde o uso do risco sacado é mais frequente devido ao volume de compras e à complexidade na cadeia de suprimentos.
Auditores independentes têm intensificado a atenção sobre essa prática. Como o risco sacado afeta diretamente o balanço patrimonial e os indicadores financeiros, a ausência de disclosure adequado pode ser vista como falha de controle interno.
Entre os pontos avaliados por auditorias estão:
Empresas que não tratam o risco sacado de forma adequada podem comprometer sua imagem perante investidores, credores e órgãos reguladores.
O contador desempenha um papel essencial na gestão de passivos, compliance financeiro e segurança da informação contábil. Para isso, é preciso:
A adoção de controles internos eficazes e a criação de políticas contábeis claras são práticas recomendadas para evitar riscos ocultos e sustentar a governança corporativa.
Sob uma ótica financeira, o risco sacado pode ser uma excelente ferramenta de gestão de fluxo de caixa e de fortalecimento da cadeia de suprimentos. No entanto, quando mal interpretado ou mal registrado, pode se tornar um risco contábil e reputacional. Veja um resumo dos prós e contras:
Vantagens:
Riscos:
O risco sacado é uma operação legítima, mas que exige rigor técnico na sua contabilização. Para o profissional contábil, o desafio é garantir que essa ferramenta de financiamento seja registrada com a devida clareza, evitando riscos fiscais, reputacionais e de governança. Se a empresa omitir ou classificar incorretamente de forma intencional, pode caracterizar prática de gestão de balanço (earnings management) e atrair questionamento de auditoria e órgãos reguladores.
Especialmente para quem atua em segmentos como construção civil, agronegócio, varejo, indústria de transformação e distribuição, o domínio sobre o risco sacado é indispensável.
Contadores atentos são peças-chave para garantir que práticas financeiras sofisticadas, como essa, sejam conduzidas com ética, transparência e precisão técnica.