Ao longo da história a mulher assumiu sempre o papel de esposa e mãe, dedicando-se à criação dos filhos e aos afazeres domésticos. Todavia, esse cenário vem mudando ao longo dos anos, e a cada dia a mulher conquista mais espaço. Porém, o caminho até aqui foi duro, e muitas pagaram um preço alto, para que pudéssemos ter êxito nessa jornada.
Bom, vamos iniciar entendendo porque comemoramos o dia internacional da mulher no dia 08 de março. Provavelmente você já ouviu falar do incêndio ocorrido em Nova York em 25 de março de 1911 na Triangle Shirtwaist Company. Neste dia trágico 146 trabalhadores morreram, sendo 125 mulheres e 21 homens.
No entanto, há registros de movimentos organizados e promovidos pelas mulheres muito antes desse episódio lamentável. Por exemplo, grande passeata das mulheres em 26 de fevereiro de 1909, em Nova York e a reunião da Segunda Conferência Internacional das Mulheres Socialistas, onde a alemã Clara Zetkin propôs a criação de uma jornada de manifestações.
Eu poderia citar aqui diversos movimentos que buscavam a igualdade de direitos e melhores condições de trabalho, mas o foco aqui é a proteção da saúde da mulher no trabalho em relação a SST.
Mas para entendermos melhor, é necessário fazer um breve histórico de como era trabalhar durante a primeira e segunda guerra mundial e especialmente no auge da revolução industrial.
A jornada de trabalho das mulheres chegava a até 16 horas diárias, com condições precárias e insalubres, além de salários muito baixos. Avançando um pouco na história, vamos lembrar de dois episódios mais específicos.
O trágico incêndio da Triangle Shirtwaist Company
O incêndio ocorrido em uma fábrica em Nova York, resultou na morte de em média 129 mulheres. A fábrica estava localizada nos últimos três pisos de um prédio de dez andares. Segundo alguns historiadores, existiam quatro elevadores com acesso à fábrica, mas apenas um estava operando e suportava apenas 12 pessoas por vez.
Havia também duas portas de saída , porém uma estava fechada do lado de fora e outra, que só permitia o acesso para dentro. Havia ainda uma escada de emergência, todavia, em péssimas condições, suportando pouco peso.
Então, como escapar? Infelizmente muitas tentaram se salvar pulando do prédio. Lembrando que era um prédio de 10 andares, e a fábrica ficava nos três últimos. Aqui você já consegue ver claramente como a segurança dos trabalhadores de um modo geral nessa época, não é de se orgulhar.
O caso das Radium Girls
Ao avançarmos mais um pouco no tempo, precisamente durante a primeira guerra mundial, temos o caso das Radium Girls (Garotas radioativas). Resumidamente, as operárias da United States Radium Corporation que, inclusive, eram muito jovens, tinham a função de pintar esferas nos relógios de forma totalmente manual. Um trabalho muito meticuloso e preciso, por isso era necessário mão firme.
Elas tinham que manter o pincel emudecido com a saliva enquanto pintavam os relógios com o rádio, substância altamente radioativa, mas que na época era considerado um elemento de luxo. As garotas eram chamadas de as moças luminosas, já que a substância era incandescente.
Nos 20 anos que se seguiram, elas foram morrendo, uma após a outra, vítimas do câncer causado pelo rádio. Novamente as mulheres foram vítimas da irresponsabilidade daqueles que deveriam protegê-las, pois ao que se sabe, não houve nenhuma investigação para verificar se haveria algum risco à saúde.
Bom, é hora de falar dos tempos atuais. Como estão e como são tratadas as condições de trabalho da mulher? Existem cuidados específicos destinados a elas?
Apesar da Constituição Federal prever a igualdade de direitos e deveres entre homens e mulheres, é fato que a mulher necessita de cuidados especiais como ocorre, por exemplo, na maternidade. Enquanto a mulher tem 120 dias de licença, o homem conta apenas com 5 dias corridos.
SST e o monitoramento da saúde da mulher na admissão
Como você já sabe, um dos procedimentos obrigatórios antes do início das atividades de qualquer trabalhador é a realização do ASO, o Atestado de Saúde Ocupacional. Na contratação, temos o exame admissional e a este todos os trabalhadores estão submetidos.
Sabe-se ainda, que ao empregador é proibida a exigência de teste de gravidez, conforme o artigo 373-A, inciso IV da CLT, visto que isso pode ser considerado como ato discriminatório.
Art. 373-A. Ressalvadas as disposições legais destinadas a corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho e certas especificidades estabelecidas nos acordos trabalhistas, é vedado:
IV – exigir atestado ou exame, de qualquer natureza, para comprovação de esterilidade ou gravidez, na admissão ou permanência no emprego.
Entretanto, como sempre digo, temos que ter atenção às exceções. Em relação ao teste de gravidez, sim, ele deve ser realizado quando a função a ser desempenhada venha a oferecer algum risco à criança e claro à gestante.
Consultas médicas e transferência de função
Ocorrendo a gravidez, mesmo antes da admissão, a trabalhadora terá direito a se ausentar de suas funções pelo tempo necessário, para a realização de no mínimo seis consultas médicas e demais exames complementares.
Um bom acompanhamento do estado gravídico da gestante reduz risco à saúde da mesma, do bebe. Lembrando que de acordo com o artigo 392, parágrafo 4°, inciso I da CLT a empregada poderá ser transferida para outra atividade afim de garantir a sua saúde e segurança.
Licença Maternidade
Após o nascimento da criança, vem o direito à licença-maternidade de 120 dias, período em que a mãe fica dedicada aos cuidados do bebe e da sua própria recuperação. Importante lembrar que se a empresa faz parte do programa Empresa Cidadã, a licença-maternidade pode ser prorrogada por mais 60 dias, conforme Lei 11.770/2008, art. 1º, I.
Durante esse período o empregador deve continuar pagando a remuneração da trabalhadora, com direito a dedução do valor pago na guia de recolhimento das contribuições previdenciárias.
SST e o monitoramento da saúde da mulher no retorno da licença-maternidade
Inicialmente há que se observar, que antes do retorno da licença-maternidade, a colaboradora deve ser submetida a um novo ASO, mas agora de retorno de afastamento e o objetivo é claro, avaliar se a saúde da trabalhadora está em condições para reassumir o seu posto de trabalho.
Importante mencionar ainda, a prática comum de conceder férias à empregada logo após a licença-maternidade. Legalmente não há nenhum empecilho quanto a isso, porém, o exame deve ser realizado antes do retorno da licença e início das férias.
Amamentação durante a jornada de trabalho
Visando a proteção da maternidade, a mãe, inclusive a adotante, tem direito a amamentar seu filho de até 6 meses, podendo este prazo ser dilatado, durante a jornada de trabalho.
Nesta ocasião, a trabalhadora tem direito a dois descansos cada um de meia hora e o horário para este fim, deve ser de comum acordo entre a trabalhadora e o empregador.
Trabalho da mulher em ambiente insalubre
Em 2017 tivemos diversas alterações na CLT por meio da Lei 13.467, mais conhecida como a lei da reforma trabalhista. Dentre as novidades trazidas pela referida lei, tivemos a criação do artigo 394-A.
Antes da reforma a CLT previa o total afastamento da empregada gestante de atividades consideradas insalubres. Com a entrada em vigor da Lei 13.467, o legislador passou a permitir o trabalho da empregada gestante e lactante em atividades insalubres, inclusive, em grau máximo, possibilitando o afastamento somente se apresentado o atestado médico com a recomendação do afastamento.
Esqueceu, porém, o legislador, que a proteção da maternidade é um direito constitucional e tem duplo grau de proteção, pois não visa somente a proteção da mãe, também da criança, por isso é considerado um direito indisponível, ou seja, não pode ser alterado ou negociado entre as partes.
Dados os fatos, o STF, guardião da Constituição Federal, por meio do julgamento da ADI 5938 considerou o artigo 394-A inconstitucional. Com o reconhecimento da inconstitucionalidade, a trabalhadora gestante ou lactante voltou a ter o direito de afastar-se de qualquer atividade considerada insalubre.
Com o devido respeito aos que discordam, vejo uma nítida sensatez na decisão da Suprema Corte sobre o tema confrontado em julgamento, visto que a proteção da vida deve estar sempre em primeiro lugar em detrimento do lucro.
Obviamente que sem lucro não temos as entidades empresariais e consequentemente não há emprego. Mas imagine se a empresa United States Radium Corporation, aquela das Garotas do Rádio, tivesse tomado os devidos cuidados com suas colaboradores, ela teria evitado a morte dolorosa e trágica dessas jovens moças, assim como teria evitado diversos processos judiciais e por fim, a paralisação de suas operações resultando no seu fechamento.
Normas Coletivas e regulamentadoras
Como vimos até agora, o trabalho da mulher, até por questões históricas, recebe especial atenção da Constituição Federal, CLT, e claro, as normas coletivas e regulamentadoras que também são fontes normativas que podem trazer proteções mais específicas, por isso, é importante observá-las.
Felizmente a figura feminina vem a cada ano conquistando mais espaço no mercado de trabalho, todavia, além da vida profissional, ainda é muito forte a presença da mulher nos afazeres domésticos, e normalmente acaba em uma dupla jornada de trabalho, e nada mais justo ter um dia especial dedicado a nós mulheres.
Feliz dia internacional da mulher!