A inteligência artificial já não é uma expectativa do futuro. Ferramentas como o ChatGPT, sistemas preditivos e soluções automatizadas vêm sendo integradas cada vez mais ao dia a dia das empresas.
No entanto, o uso dessas tecnologias coloca uma questão urgente na mesa dos gestores: como garantir a conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), ao lidar com dados sensíveis?
A resposta não é simples — mas é necessária. Afinal, se esse tipo de inovação depende justamente de coleta e processamento de dados em grande escala, o risco de privacidade e, consequentemente, de infrações legais cresce na mesma proporção.
E para quem está na liderança de qualquer negócio, ou seja, na posição de tomar decisões estratégicas e assumir riscos, ignorar isso pode custar caro: multas, sanções, bloqueios de operação e perda de reputação são apenas algumas das consequências possíveis.
A inteligência artificial está remodelando a forma como as empresas operam, tomam decisões e se relacionam com clientes. Ferramentas de IA generativa, como o ChatGPT e outras, são capazes de automatizar tarefas, responder a demandas com agilidade, criar conteúdo e até mesmo gerar insights estratégicos, com base em grandes volumes de dados.
Contudo, esse potencial só se realiza de forma sustentável, se for acompanhado por uma estrutura sólida de governança de informação. E é justamente aí que a Lei Geral de Proteção de Dados se torna peça central.
A legislação, em vigor desde 2020, determina regras claras para o tratamento de dados de pessoas, exigindo que empresas de todos os portes — e não apenas as grandes techs — estejam alinhadas com as normas de privacidade e segurança.
A lei define “tratamento de dados” como qualquer operação realizada com informações relacionadas a pessoas naturais — da coleta à eliminação. Isso inclui atividades como registro, armazenamento, uso, compartilhamento, análise e descarte.
Ou seja, se sua empresa lida com informações de clientes, funcionários, fornecedores, sócios ou parceiros — direta ou indiretamente — você está sujeito às obrigações da LGPD. Isso inclui, na prática, todas as empresas brasileiras.
Além disso, a LGPD determina que o tratamento de dados só é considerado regular se for realizado em alguma das 10 bases legais previstas (como consentimento, obrigação legal, legítimo interesse, entre outras) e se a empresa garantir a privacidade do titular (a pessoa identificada pelos dados).
Diante do contexto legal, já é possível antever que o uso desenfreado de IA generativa e ferramentas similares pode trazer riscos legais. Alguns desses riscos são os seguintes.
Ao usar IA, muitos dados são processados automaticamente — geralmente sem a percepção clara do usuário ou do responsável pela operação. A ausência de base legal válida para o tratamento de dados pessoais em ferramentas desse tipo configura risco jurídico altíssimo, pois fere diretamente o art. 7º da LGPD.
Informações sobre origem racial, religião, saúde, opinião política ou filiação sindical, por exemplo, são consideradas “dados pessoais sensíveis” pela lei. Caso sua IA, chatbot ou sistema automatizado tenha acesso a esses dados, o risco de infração é ainda mais grave. Isso exige protocolos adicionais de segurança e transparência.
Se a sua empresa lida com dados de crianças ou adolescentes — direta ou indiretamente — deve seguir regras ainda mais restritivas, conforme o art. 14 da LGPD. Isso inclui, por exemplo, a necessidade de consentimento específico dos responsáveis pelo menor.
O artigo 15 determina que os dados devem ser excluídos assim que a finalidade legal que autorizou o tratamento for cumprida. Manter dados sem justificativa legal ou por tempo indeterminado, nos histórico de ferramentas de IA, pode configurar ilegalidade.
Ferramentas como o ChatGPT podem parecer inofensivas, mas seu uso deve ser criterioso dentro das empresas. Imagine, por exemplo, um colaborador inserindo informações de clientes ou dados internos da empresa numa IA, sem saber onde essas informações são armazenadas ou como são utilizadas. Isso, por si só, já configura risco de infração à LGPD, além de exposição indevida dos dados do cliente a terceiros (sem que ele saiba).
Em diversas empresas, é provável que soluções baseadas em IA sejam utilizadas em áreas como:
Em todos esses casos, o uso de IA sem governança de dados adequada pode comprometer a conformidade e a reputação da empresa.
A gestão de riscos corporativos — também conhecida como Enterprise Risk Management — se torna ainda mais estratégica nesse novo contexto. O papel da área é identificar, analisar e mitigar os riscos relacionados à privacidade, segurança da informação e conformidade com a LGPD.
Não se trata de eliminar riscos totalmente — o que seria impossível — mas de agir com previsibilidade e responsabilidade. Isso inclui:
Uma gestão de riscos eficiente ajuda a evitar danos financeiros, operacionais e reputacionais, além de criar uma cultura de segurança e inovação responsável.
Empresas líderes estão adotando o conceito de privacy by design, ou seja, a privacidade é incorporada ao projeto desde o início — e não adicionada depois como remendo.
Na prática, isso significa que ferramentas, sistemas e processos já nascem respeitando as diretrizes da LGPD. Essa abordagem não apenas reduz riscos, mas também agrega valor à marca e aumenta a confiança do cliente, especialmente em mercados onde a transparência é um diferencial competitivo.
Além disso, à medida que a inteligência artificial avança, torna-se inevitável repensar os modelos de negócio com foco em segurança, ética e responsabilidade.
O uso de inteligência artificial e ferramentas como o ChatGPT pode — e deve — fazer parte da estratégia de empresas modernas. No entanto, isso exige uma postura proativa em relação à proteção de dados e à gestão de riscos.
Estar em conformidade com a LGPD não significa frear a inovação, mas garantir que ela ocorra de maneira sustentável, segura e alinhada às expectativas do mercado e da sociedade.
Empresas que se antecipam e adotam padrões elevados de privacidade tendem a liderar o jogo — e não apenas sobreviver a ele.